A dignidade humana é uma dignidade animal: aportes para a compreensão da dignidade animal como valor jurídico no Direito brasileiro
Mots-clés :
Animalidade do humano, Dignidade da pessoa, Enfoque das capacidades, Vedação da crueldade, Vedação da torturaRésumé
Neste artigo, propõem-se alguns deslocamentos conceituais a fim de compreender a dignidade animal como valor jurídico no Direito brasileiro. Para tanto, propõe-se tratar a dignidade humana como uma dignidade animal, descentralizando a racionalidade como fundamento da dignidade. Neste giro ao enfoque das capacidades de Martha Nussbaum, a dignidade funda-se nos atributos bio-orgânicos e sociocognitivos da animalidade que se instanciam em diversas racionalidades práticas, formas de sociabilidade e necessidades corporais, especializando-se nas chamadas “capacidades” dos indivíduos para buscar a satisfação de suas necessidades e interesses e o seu florescimento. O próximo deslocamento conceitual é tratar a dignidade, que funda a ordem jurídica brasileira, como valor inerente da pessoa (humana e não humana), fundamento valorativo do direito absoluto de respeito à pessoa e ao seu valor intrínseco, e que tem como corolário a adoção das regras constitucionais que proíbem tortura, tratamento cruel, degradante e desumano no Brasil. Tal tratamento jurídico permite avançar aos desdobramentos do princípio do respeito à dignidade da pessoa, seus cinco elementos [valor intrínseco da pessoa; igualdade; autonomia; mínimo existencial e reconhecimento] e pensá-los para os outros animais, a fim de afirmar e concretizar os direitos fundamentais que operacionalizam o respeito à dignidade da animalidade.
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