TELETRABALHO: NOVAS FORMAS DE SUBSUNÇÃO DO TRABALHO AO CAPITAL?

Authors

  • Antônio De Pádua Melo Neto

DOI:

https://doi.org/10.25247/2447-861X.2006.n223.p18%20-%2031

Abstract

Os impactos que as novas tecnologias da informação e da comunicação, de base microeletrônica, têm provocado nos processos de trabalho e na alocação da força de trabalho pelas firmas têm sido objeto de estudos de numerosos especialistas. Um desses impactos, que implica reformulações tanto do contrato jurídico entre trabalhador e capitalista quanto na materialidade do processo de trabalho, é o que se costuma denominar como teletrabalho. Administradores, juristas, sociólogos e economistas que estão se debruçando sobre esse novo fenômeno possuem em comum a idéia, expressa ou não, de que o teletrabalho pode ser caracterizado pela flexibilidade espacial e temporal no uso da força de trabalho devido ao uso da telemática e da informatização. Nas palavras de Carla Carrara Jardim (2003: 11; 38), o prefixo ‘tele’ está sendo entendido como telecomunicações, mas quer dizer ‘distância’; por esse motivo, a primeira acepção do teletrabalho é o trabalho a distância, para depois ser acoplada a expressão “uso da conexão informática na execução do trabalho, substituindo o contato físico com os colegas pelo contato virtual”. (...) Quando se pensa na desconcentração da atividade assalariada deve-se ter em mente que o teletrabalho atendeu a esse paradigma [da deslocalização produtiva], pois carregava em si a possibilidade de flexibilizar o local e o tempo do trabalho, com reflexos na remuneração e nas condições contratuais É importante observar como permanece para vários autores da idéia de que o uso das novas tecnologias de comunicação e a flexibilidade configuram o teletrabalho. Assim, segundo Alberto Trope (1999: 13), o teletrabalho caracteriza-se pela “utilização de ferramentas de telecomunicações para receber e enviar o trabalho”. Ou, conforme Margareth Bacellar (2003: 2), o teletrabalhador é aquele que “dentro de sua própria casa pode prestar o serviço, bastando para tanto ter um computador com acesso a Internet”. E, por último, nas palavras de Álvaro Mello (1999: 4), o teletrabalho “consubstancia o ato de exercer atividades que podem ser realizadas em um domicílio ou local intermediário, visando à competitividade e flexibilidade dos negócios”. Entretanto, não é apenas a caracterização do teletrabalho que permanece, de certo modo, constante entre diferentes autores. A esmagadora maioria deles insiste no potencial que o teletrabalho tem de dotar de novos sentidos diversos trabalhos antes desenvolvidos no interior das firmas e sobre o olho quase onipresente da gerência. Entre esses novos sentidos estariam a maior democratização do trabalho e melhorias da qualidade de vida (cf. Mello, 1999 e Trope, 1999). Muitos deles autores chegam mesmo a afirmar que, “da mesma forma que a máquina liberou o homem de um certo número de tarefas sofríveis, as ferramentas da Informática o liberam do escritório” (Trope, 1999: 12). Salta aos olhos o caráter manifestamente apologético desses escritos. Embora contextualizem o surgimento do teletrabalho, são incapazes de enxergá-lo como uma das muitas formas utilizadas pelo capital, na sua atual fase de acelerada reestruturação produtiva, de maximizar a extração de sobretrabalho e repor e intensificar, através de novos métodos, a subsunção do trabalho ao capital. Tais autores esquecem-se de que as mudanças tecnológicas e organizacionais empreendidas pelo capital são sempre destinadas “a baratear mercadorias e a encurtar a parte da jornada de trabalho que o trabalhador precisa para si mesmo, a fim de encompridar a outra parte da sua jornada de trabalho que ele dá de graça para o capitalista” (Marx, 1996, Tomo 2: 7). É por isso que as ciências e as técnicas, de acordo com André Gorz (2001: 222), “trazem a marca da idéia que a burguesia se faz de sua função e dos fins que ela lhes atribui ou que, pela mediação do sistema no qual elas se encontram, ela lhes ‘sugere’ ou ‘proíbe’”. Assim, a tecnologia, na sociabilidade do capital, é mera ferramenta para acumulação de capital, e é nesse contexto que deve ser compreendida. Portanto, o objetivo do presente trabalho é interpretar o fenômeno do teletrabalho à luz do processo geral de subsunção do trabalho ao capital. Para tanto, está dividido em duas partes. A primeira retoma a questão da atual reestruturação produtiva do capitalismo (mostrando quais as suas principais características), que serve com contextualização necessária – teórica e histórica – para se explicar o surgimento e o desenvolvimento do teletrabalho. Afinal, não é possível falar da “flexibilização do local de trabalho” promovida pelo teletrabalho sem nenhuma menção às características centrais da acumulação flexível, sem entender que essa forma específica de flexibilização está inserida no quadro maior da difusão da empresa-rede e do toyotismo. A segunda parte contém uma reflexão teórica sobre as mudanças que a implantação do teletrabalho imprime (e exige) nos processos de trabalho (que são também, é claro, processos de valorização). Ao final, tem-se uma breve reflexão conclusiva sobre as questões levantadas ao longo do artigo.

Published

2016-06-17

How to Cite

Melo Neto, A. D. P. (2016). TELETRABALHO: NOVAS FORMAS DE SUBSUNÇÃO DO TRABALHO AO CAPITAL?. Cadernos Do CEAS: Revista crítica De Humanidades, (223), 18–31. https://doi.org/10.25247/2447-861X.2006.n223.p18 - 31

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Artigos

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